Alguns dos primeiros críticos do romance de Neil Gaiman e Terry Pratchett disseram que faltavam boas linhas. Mas poderíamos passar o dia todo citando trechos impressionantes …

No próximo ano,  Good Omens completa 30 anos. Durante essas três décadas, vendeu milhões de cópias em todo o mundo e foi adaptado para o rádio. Terry Gilliam uma vez tentou fazer um filme dele e (provavelmente) vai ser uma grande série de TV esse ano.

Seus autores, enquanto isso, venderam individualmente vários milhões de livros e montaram indústrias inteiras em torno deles. Mas nas notas na parte de trás de Good Omens, tanto Neil Gaiman quanto Terry Pratchett insistem que escrever o livro “não era grande coisa”. O que eles dizem que devemos lembrar é que “naqueles dias Neil Gaiman mal era Neil Gaiman e Terry Pratchett era apenas Terry Pratchett”.

Quando foi lançado nos EUA, houve uma grande comoção referente ao livro. A revista  Publishers Weekly usou o descritor contundente “excêntrico”, enquanto Joe Queenan, do New York Times, parecia furioso por estar lidando com essa importação. Ele descreveu o livro pela primeira vez como uma cura para a “doença recorrente da anglofilia*” – e, em seguida, realmente chutou quem já estava no chão:

 

“Good Omens é um descendente direto d’O Guia do Mochileiro das Galáxias, um livro ou programa de rádio amplamente divulgado ou algo que se tornou bastante popular na Grã-Bretanha há uma década quando se tornou evidente que Margaret Thatcher estaria no cargo por algum tempo e que risadas seriam difíceis de encontrar.” 

 

Cito com humilde apreciação de quão errados nós, críticos, podemos ser. Ficou pior para Queenan, que reclamou de “uma piada irritante sobre Queen, um grupo de rock vaudevilliano cujos sucessos foram enterrados no passado e que deveriam ter sido enterrados mais cedo”. Mas é claro. Quem se lembra deles agora?

Mas não deveríamos rir disso. Na verdade, é uma revisão bastante espirituosa – e o tempo traz vergonha para cada crítica mais cedo ou mais tarde. No entanto, simpatia tem limites. É difícil sentir qualquer coisa, exceto desgosto quando Queenan escreve: “Obviamente, seria difícil escrever um romance satírico de 354 páginas sem sair de algumas linhas boas. Eu contei quatro.”

 

Sério? Aqui estão quatro linhas dos quatro primeiros capítulos:

 

“Deus não joga dados com o universo; Ele joga um jogo inefável de sua própria concepção, que pode ser comparado, da perspectiva de qualquer um dos outros jogadores (todos os dois), a estar envolvido em uma versão obscura e complexa de poker em uma sala escura, com cartões em branco, para apostas infinitas, com um apostador que não vai te dizer as regras, e que sorri o tempo todo.

 

“Mesmo um observador casual poderia ter visto que estes [modelos de aviões] foram feitos por alguém que era meticuloso e cuidadoso, e que também não era bom em fazer modelos de aviões.”

 

“Milton Keynes é uma cidade nova aproximadamente no meio do caminho entre Londres e Birmingham. Ela fora construída para ser moderna, eficiente, saudável e, no fim das contas, um lugar agradável para se viver. Muitos britânicos acham isso divertido ”.

 

“Existem alguns cachorros que, quando você os encontra, lembram você de que, apesar de milhares de anos de evolução direcionada pelo homem, cada cachorro ainda está somente a duas refeições de distância de ser um lobo. Esses cães avançam deliberadamente, com um objetivo, a selvageria encarnada, os dentes amarelos o hálito fétido, enquanto à distância seus donos dizem: “É só um cachorro velho, basta cutucá-lo se ele aborrecer muito”, e no verde de seus olhos as fogueiras vermelhas do Pleistoceno reluzem… “

Há muito mais de onde esses vieram, bem como algumas pequenas e maravilhosas piadas sobre a TV Galesa e várias lindas construções e longas frases que só funcionam dentro do contexto do livro.

 

Aqui está uma quinta “boa linha”:

 

“Pode ajudar a entender os assuntos humanos para ficar claro que a maioria dos grandes triunfos e tragédias da história são causados, não por pessoas sendo fundamentalmente boas ou fundamentalmente más, mas por pessoas sendo fundamentalmente pessoas.”

 

Isso não é apenas divertido – é silenciosamente profundo. Que é o outro grande destaque sobre Good Omens. Talvez as pessoas tenham comprado pelas as piadas, mas a minha suspeita é que o humanismo suave e a irreverência determinada do romance ressoam tanto com os leitores do livro quanto com os “leitores de uma linha”. Pratchett e Gaiman são capazes de escrever bem. Por enquanto, sinta-se à vontade para continuar a provar que o pobre e velho Queenan está errado postando mais de suas linhas favoritas no livro.

 

Anglofilia*: admiração pela Inglaterra, seus costumes, habitantes e cultura.

 

Vi no The Guardian 

 

 

Written By

May

Uma whovian que nunca esquece de levar sua toalha na TARDIS e nunca dispensa uma xícara de chá. Ainda acha que vai encontrar a pergunta fundamental sobre A Vida, o Universo e Tudo o Mais em alguma viagem no tempo ou no espaço.